sábado, 14 de maio de 2011

O voto de Jacó.

Perceberemos neste artigo, que a história de Jacó compromete a teologia sistemática dos defensores do atual sistema de dízimos. O voto feito por Jacó a Deus estava vinculado pela condicional “SE”. Sendo assim o conceito dizimista pregado hoje nas igrejas fica desestabilizado. Jacó deveria ser considerado por aqueles que defendem a doutrina do dízimo um dizimista exemplar. Filho de Isaque. Neto de Abraão. Herdeiro da Promessa. Patriarca escolhido por Deus para fundar a nação israelita. Por que então quase não se ouve pregadores citando o exemplo de Jacó quando o assunto é dízimo? Simplesmente porque Jacó compromete a teologia sistemática tendenciosa daqueles que estão buscando provar que a doutrina do dízimo, conforme ensinada hoje, tem fundamento bíblico. O princípio fundamental da interpretação bíblica é que uma doutrina para ser válida precisa obedecer a pelo menos dois parâmetros simples:
a) Não se pode criar uma doutrina em cima de uma só passagem bíblica.
b) Todas as passagens sobre um mesmo tema doutrinário têm que ter coerência entre si.
Desta forma, o dízimo de Jacó teria que estar em consonância com todos os outros textos bíblicos que falam sobre dízimo. Se o assunto é dízimo, os princípios contidos na história de Jacó têm de fazer parte da sistematização teológica global deste ensino. Mas, os princípios dizimistas contidos na história de Jacó nos levam a outras conclusões: “SE” - Esta pequena palavra faz toda a diferença. Jacó aparece orando a Deus. Parece um grande duvidador. “Senhor, se eu for abençoado, se eu tiver comida, roupas, proteção, então em pagarei dízimos”. Observe que o ônus da prova estava com Deus. Se Deus não o abençoasse ele não deveria pagar nenhum dízimo ao Senhor. “Primeiro a Benção. Depois meu Dízimo!”. Gn. 28: 20 São assim que se ensina nas igrejas hoje? Claro que não! Primeiro mandam pagar os dízimos. Depois virão as “bênçãos”. Nunca se fala do “SE” de Jacó. O dízimo de Jacó era condicional. Não a benção. Hoje aprendemos o oposto. A benção de Deus é condicional. Quem paga o dízimo a receberá!
VOTO – “Fez Jacó um voto” Gn. 28: 20. Ora, se Jacó fez um voto, obviamente ele não era um dizimista, tão pouco Isaque, tão pouco Abraão. Será possível que Jacó, criado no rigor da religião patriarcal não teria aprendido de seu avô e de seu pai esta prática, caso ela realmente existisse? Voto é voto. É propor algo novo a Deus na busca de uma melhor experiência espiritual. Imagine um fiel católico fazendo um voto, uma promessa, a Santa Ana. Ele se levanta pela manhã e diz: “Minha querida Santa Ana, se tu me deres saúde, prometo todos os dias da minha almoçar e jantar”. Isto é voto? Como pode alguém votar algo que já faz parte de sua rotina. Jacó, naquela idade, nunca tinha pagado nenhum dízimo a Deus. Resolveu então aumentar sua experiência religiosa fazendo um voto.
MÚLTIPLAS CONDIÇÕES AGREGADAS – Há um terceiro aspecto interessante neste relato. Jacó propõe a Deus cinco condições agregadas.
(A) Se Deus for comigo – (Presença de Deus).
(b) Se me guardar nesta viagem – (Proteção).
(c) Se me der pão – (Alimento).
(d) Se me der vestes para vestir. - (Roupas).
(E) Se eu voltar em paz à casa de meu pai – (Realização)
Observem que as cinco condições estão unidas pela preposição “E” Ge. 28: 20. Se Deus atendesse quatro dos cinco itens da lista de requisições, Jacó estaria automaticamente livre de cumprir o voto. Ele propôs APROVAÇÃO + PROTEÇÃO + COMIDA + ROUPA + PAZ. Tudo junto! Só cumpriria seu voto se recebesse todas as cinco bênçãos. Você já ouviu alguém ensinando: “Irmão, pague seu dízimo a nossa igreja somente quando você estiver completamente feliz. Quando você tiver paz, saúde, dinheiro, comida farta e boas roupas, então traga seu dízimo ao Senhor. Se lhe faltar algum destes itens considere-se isento desta obrigação.” É assim que nos ensinam hoje? COPIAR RITUAIS – Em nenhum lugar a Bíblia ordena que os cristãos do século XXI devem copiar ou imitar votos da era patriarcal. Jacó resolveu fazer um voto a Deus e prometeu-lhe pagar dízimos. E daí? Devemos todos nós hoje fazer o mesmo? Que tal então, começarmos a procurar uma pedra, pô-la como coluna e declarar que ali é a casa de Deus. Ge 28: 29. Ou prometer sacrificar nossas filhas em holocausto ao Senhor como fez Jefté. Jz. 11: 30-40. Ou deixar um de nossos filhos sem cortar o cabelo para sempre, como fizeram os pais de Sansão Jz. 13: 3-5. Ou entregar nossos filhinhos menores de três anos à igreja para ali morarem pelo resto de suas vidas, como fizeram Ana e Elcana, pais de Samuel. I Sm. 1: 10-11.
OUTRAS PERGUNTAS INTERESSANTES:
Se Jacó não era obrigado a pagar dízimos (antes do voto) por que os cristãos teriam esta obrigação hoje? Se Abraão era um fiel dizimista, porque não passou este ensinamento para seu neto Jacó? Na era patriarcal não era o ensino religioso transmitido de pai para filho, neto, bisneto, etc.? Se Jacó fez um voto sobre dízimo, é sinal que este hábito não era requerido dele antes, não é mesmo? Então, por que requerer dízimos dos cristãos hoje? A quem Jacó pagou seus dízimos? Como ele cumpriu este voto? Se o dízimo de Jacó foi pago em forma de dinheiro quem recebeu esta importância? Obviamente Jacó seguiu os princípios bíblicos de dízimo. Pagou seu dízimo em forma de alimento. Certamente ele o comeu em rituais litúrgicos ou o distribuiu aos pobres e necessitados. Não pode ter havido outra forma para Jacó cumprir a promessa. Nos seus dias ainda não havia templo, sacerdotes, levitas. O mais racional é aceitar que Jacó seguiu as aplicações dizimistas que anos mais tarde seriam consolidadas por Moisés em Deuteronômio 14 e outros textos já mencionados. O voto de Jacó é o voto de Jacó e não seu. Ele votou pagar dízimos. Deve ter cumprido. Que temos nós a ver com o voto de Jacó? Devemos dar hoje dez por cento de nossos salários à igreja, só porque Jacó fez um voto a Deus há mais de 3.500 anos atrás? Lembrem-se, porém que o objetivo do assunto é contra argumentar sobre a devolução dos dízimos e nunca das ofertas voluntárias, ainda que você voluntariamente doe mais de dez por cento.

domingo, 1 de maio de 2011

E o diabo? Parte II

O novo testamento, sob diversos nomes, alude 73 ao que comumente hoje se chama demônios. O novo testamento usa, além de daimonion, os nomes: “diabo e seus anjos” Mt. 25: 41; “espíritos imundos” Mt. 10: 1; “espírito impuro” Mc. 1: 23 etc. Demônios e os outros termos se usam indistintamente. No singular ou no plural. Assim, por exemplo, a mesma pessoa que, segundo Marcos 5: 2 é possuída por um espírito impuro, no singular, pouco depois, no mesmo Marcos verso 13 está possuída por espíritos imundos, no plural; segundo Lucas 8: 27 essa mesma pessoa está possuída por demônios, no plural; mas imediatamente, no mesmo evangelho de Lucas verso 29 Jesus identifica esses demônios como um espírito impuro e no verso seguinte (30) Lucas diz que são muitos demônios. Termo “demônio” no antigo testamento? Uma primeira constatação é que o termo demônio (ou o equivalente hebraico para traduzir exatamente o termo grego daimonion), tão freqüente no novo testamento, não aparece nos originais do antigo. A palavra demônio no antigo testamento é só fruto de traduções posteriores. Quem ou o que é o demônio? Uma análise primeiramente sobre o que chamam de demônio no antigo testamento. Ídolos. Os sátiros (espécie mitológica de bode), “seres peludos” descritos por Isaías, inspirado nas divindades mesopotâmicas, são convertidos na tradução dos setenta em demônios, Is. 13: 21; esses mesmos sátiros, esses mesmos demônios, em Levíticos, são na tradução na tradução dos setenta, simplesmente “ídolos e coisas vãs” Lv. 17: 7. Coisas, não existem como seres pessoais. Em outra oportunidade os ídolos se traduzem por demônios, Is. 65: 3 condena os ritos dos pagãos, que fazem sacrifícios aos ídolos nos jardins e queimam perfumes sobre lajes, irritando assim a Deus. Quando adoram os ídolos, adoram aos “demônios que não existem”, de acordo com a tradução dos setenta. Moisés repreende aos que sacrificavam (em honra de) demônios, falsos deuses, a deuses que não haviam conhecido novos, recentemente chegados Dt. 32: 17. Abertamente chama-se demônios (sedin) em todas as traduções, às divindades Cananéias. Só em outra oportunidade aparece na bíblia a mesma palavra sedin, que mais uma vez é traduzida por demônios, e de novo representam os ídolos de Canaã, aos quais se ofereciam sacrifícios humanos: “Eles serviram seus ídolos... e sacrificaram seus filhos e suas filhas aos demônios (sedin), e derramaram o sangue inocente de seus filhos e de suas filhas que sacrificaram aos ídolos de Canaã” Sl. 106: 36, também no verso 37 os deuses, touros alados da mitologia Assíria, são traduzidos por demônios. E quando Is. 65: 11 fala de Gad. o deus arameu da fortuna, os setenta substituem Gad. por demônio. Influencias pagãs. A antiqüíssima demonologia-divindade da literatura suméria, os perniciosos deuses-demônios chamados udug, e a demonologia acádia influenciaram os hebreus do Antigo Testamento, e através dos caldeus penetraram o mundo grego e depois o romano. Pouco antes de Cristo, a influência volta aos judeus, através da cultura grega, resultante da dominação romana. Dois séculos antes de Cristo e no próprio século 1º d.C., a demonologia judaica manifesta reflexos da demonologia mesopotâmica e grego-romana. Demônios e demônio são as traduções vernáculas para os termos daímones no plural e daímon no singular na versão dos Setenta. Tenhamos em conta que esta tradução foi feita precisamente nesta época neo-testamentária. Ora, na literatura grega e na época helenística, daímon e daímones significam deus e deuses: divindades de grau inferior. Os judeus na época neo-testamentária, também adotaram esta denominação. Flávio Josefo, o historiador judeu que escrevia no século primeiro, várias vezes emprega o termo daímones como sinônimo de deuses. Levemos em conta que o todo o Novo Testamento foi escrito em grego. O termo daímon procede de daiomai, que significa distribuir: eram os deuses que distribuíam os bens e os castigos aos homens. Neste mesmo sentido, os pagãos usam o termo daímones com referência à pregação de Paulo. “Dir-se-ia um pregador de divindades daímones exóticas, porque ele anunciava Jesus e a Ressurreição” At 17: 18. Os que escutavam Paulo usaram o termo daímones no plural porque acreditavam que Jesus era anunciado como um deus e a Ressurreição como uma deusa. Tudo influencia os primeiros cristãos. Se os povos orientais influenciaram muito os judeus e, em seqüência, em Paulo, influíram mais ainda na demonologia dos primeiros cristãos. Justino, Clemente de Alexandria etc. refletem claramente a mentalidade demonológica dos egípcios. Orígenes, no começo do século III, teve uma influência decisiva na demonologia cristã que lamentavelmente permanece até hoje. Os demônios maus. O daímon, demônio, divindade inferior, vai deixar de ser um intermediário entre Deus e as criaturas, para o bem ou para o mal, e converte-se num ser unicamente mau. Para Paulo, apostatar da fé é equivalente a escutar os ensinamentos dos demônios-deuses pagãos 1 Tm 4,1; a idolatria equivale a misturar-se com demônios-ídolos, que sustentam o paganismo 1 Cor 10: 20. E assim passou-se a considerar os demônios como seres maus e desprezíveis.
Extraído do livro: Antes que os demônios voltem.