quinta-feira, 15 de setembro de 2016

As duas naturezas de Cristo, é bíblica ou pós bíblica?

O cristianismo do 3º século em diante achou necessário transformar Jesus em Deus. Talvez por necessidade dos novos convertidos os quais viviam a realidade da cultura helenística, isto é, respiravam o ensinamento os quais acreditavam que os deuses podiam se encarnar, ou mais propriamente acreditavam que os deuses tomavam para si mulheres e com estas tiveram filhos. Mas como transformá-lo em Deus se ele Jesus era humano?

Foi então que os padres dos primeiros séculos adeptos da filosofia de Sócrates, Platão, Plotino, Heráclito e outros se valeram da mesma e ensinaram que Jesus é o Deus-homem. No livro (História da filosofia ocidental, vol. Pág. 330) diz: “O Deão Inge em seu inestimável livro sobre Plotino enfatiza com muita precisão o que o cristianismo deve a ele. O platonismo diz ele, é parte da estrutura vital da teologia cristã, com a qual ouso dizer, nenhuma outra filosofia pode se conciliar sem atritos. Há uma absoluta impossibilidade de extrair o platonismo do cristianismo sem destruir por completo o cristianismo.”

Assim sendo e se valendo deste ensinamento, os pais conciliaram a filosofia grega aos escritos apostólicos principalmente o texto de João o qual cita que a palavra ou o verbo estava com Deus. Jo. 1.1 No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.” Já a bíblia boa nova em português corrente diz: No princípio era a Palavra. A Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus.” Como já dito em assuntos anteriores os tradutores optaram por Verbo com V em maiúsculo ao invés de palavra pelo fato desta ser feminino.

     Assim mesmo a própria tradução em português corrente faz um trocadilho e opta por escrever palavra como sendo masculino; Jo. 1. 2-3 “Aquele que é a Palavra estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por meio dele, e sem ele nada foi criado.” O certo seria: “Todas as coisas foram feitas por meio dela” . O que João pretendeu dizer ao descrer a palavra grega logos? Estaria ele falando daquilo que ela representava ou estaria dando outro significado?

Logos significa muitas coisas entre elas estão:  O ato de falar, palavra proferida a viva voz, aquilo que expressa uma concepção ou ideia. o que alguém disse. Palavra, os ditos de Deus, seu uso com respeito a MENTE em si, causa, motivo. Este é a real aplicação para o termo logos, mas através de Heráclito esta palavra ganhou outra conotação, Foi nos escritos de Heráclito que a palavra "logos" mereceu especial atenção na filosofia da Grécia Antiga. (1).

O estoicismo é uma doutrina filosófica que afirma que todo o universo é corpóreo e governado por um Logos divino (noção que os estoicos tomam de Heráclito e desenvolveram. A alma está identificada com este princípio divino, como parte de um todo ao qual pertence. Este logos (ou razão universal) ordena todas as coisas: tudo surge a partir dele e de acordo com ele, graças a ele o mundo é um cosmos (termo que em grego significa "harmonia"). Visto que o homem buscava intensamente essa harmonia e tranquilidade de vida.

Devido a isso na teologia cristã o conceito filosófico do Logos viria a ser adaptado e tornou-se um Deus encarnado. Assim sendo Para Heráclito o logos é a razão que domina todo o universo e que faz possível a existência de ordem e regularidade no acontecimento das coisas. Para Ele, o logos também está presente em nós e que deve servir para guiar-nos na nossa conduta e como instrumento para o verdadeiro Conhecimento. Já na comunidade cristã, o termo logos tornou-se o divino mediador da criação que se fez carne. Muitos acreditam que o termo logos pertence ao cristianismo genuíno. Porém o conceito logos havia surgido no contexto cultural helenista.

Outra questão importante reside no fato de os escritos do AT. Não atribuir ou comparar a palavra criadora de Deus com uma pessoa; Gn. 1.3Disse Deus: Haja luz; e houve luz.” A palavra original “Disse Deus” אמר é traduzido como ’amar e significa literalmente: dizer, falar, proferir, ordenar; diz apenas que Deus falou e tudo se fez, nada diz de um ser intermediário agindo com função criadora. O salmista compartilha deste pensamento ao dizer em Sl. 33. 6 “Os céus por sua palavra se fizeram, e, pelo sopro de sua boca, o exército deles.”

O verso 9 do mesmo capítulo corrobora com esta visão “ Pois ele falou, e tudo se fez; ele ordenou, e tudo passou a existir. Não há como acreditar em um ensinamento tão modificado, a bíblia é clara em dizer que o ato criador de Deus foi através de sua ordem expressa, porém, ao estabelecer a filosofia grega como sendo a base do ensino cristão maculou-se a religião.

Com o intuito em objetar muitos irão recorrer o verso de João lido acima e dirão: se é assim como resolver a questão onde diz que o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus? Tendo em mente que Verbo é o mesmo que palavra, podemos entender que a palavra, a sua voz, é em última instância a sua autoridade, vontade e intenção, portanto o representa. Assim sendo a prova deve ser exigida para os objetores, os quais terão de responder o seguinte:

O Verbo ou palavra é uma pessoa separada de Deus e estava com Deus na criação? Se disserem que sim, fica claro que existem dois deuses. Ou seja, não há nenhuma lógica em afirmar que Deus estava com Deus e mesmo assim não ser dois deuses, inclusive tal ensinamento joga por terra o monoteísmo bíblico e mesmo a doutrina trinitária, portanto a única lógica plausível é acreditar que o Verbo ou a palavra de Deus é a sua intenção, propósito e ação que em última instância o traduz.  

Hb. 11. 3 Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem.” Aqui o autor da carta aos hebreus acertadamente confirma o ato criador feito por Deus e diz que tal ato foi feito por sua palavra, o interessante que neste verso não é usado a palavra logos para descrever palavra, mais sim rhema, que quer dizer: aquilo que é ou foi proferido por viva voz, algo falado, palavra, qualquer som produzido pela voz e que tem sentido definido, fala, discurso, aquilo que alguém falou.

Fica claro então que o ensinamento das duas naturezas de Cristo, de um logos como sendo uma pessoa separado de Deus, contradiz claramente o ensino bíblico, os pais da igreja levaram anos e mesmo séculos para tentarem elaborar um ensinamento coerente acerca das duas naturezas de Jesus, e por fim foi dogmatizado como infalível.

Evandro.