segunda-feira, 1 de abril de 2019

A casa do pai, analisada pelo contexto bíblico

Jo. 14. 1-3 “Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vô-lo teria dito. Vou preparar-vos lugar. E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também".

Quando lemos ou ouvimos estas palavras ditas por Jesus, somos automaticamente levados a imaginar que tal declaração refere-se a um lugar no céu, as ditas moradas celestiais, isso acontece devido ao fato de sermos doutrinados desde sempre a pensar assim. Mas, será que isso realmente procede? Estaria Jesus dando aos seus discípulos esta informação?

Primeiramente nós devemos ter em mente, que as declarações ditas por Jesus teve como público-alvo os seus discípulos e posteriormente aqueles que fariam parte do seu aprisco, logo os versos de João 14. 1-3 são palavras ditas por um judeu e para os judeus. As interpretações teológicas referente a esses versos os quais tem nos influenciados, à acreditarmos nas moradas celestes, são produtos da igreja ao longo dos séculos.

Jesus disse: Na casa de meu pai... o crente atual rejubila dizendo, a casa do pai fica no céu, logo, vamos morar no céu. No entanto, qual era o conceito de casa de Deus nos dias bíblicos? Estariam os discípulos com a mente direcionada a acreditar (como ensinam certas denominações) em mansões celestiais? 1ª Cr. 22. 10 “Ele edificará uma casa ao meu nome, e me será por filho, e eu lhe serei por pai, e confirmarei o trono de seu reino sobre Israel, para sempre”.

Era comum no pensamento judaico ter Deus como pai, Sl. 89. 26 “Ele me chamará, dizendo: Tu és meu pai, meu Deus, e a rocha da minha salvação”. Mesmo aqueles que não creram em Jesus tinham Deus por pai, era uma questão cultural, Jo. 8. 41 “Vós fazeis as obras de vosso pai. Disseram-lhe, pois: Nós não somos nascidos de fornicação; temos um Pai, que é Deus". Jo. 20. 17 “Disse-lhe Jesus: Não me detenhas, porque ainda não subi para meu Pai, mas vai para meus irmãos, e dize-lhes que eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus”.

Baseado nestes poucos versos, fica fácil perceber que ter Deus como pai, fazia e faz parte da religiosidade judaica. E quanto a casa de Deus? Ao Jesus dizer as palavras: “na casa de meu pai” foram os discípulos levados a pensar em um lugar no céu? Bem, se seguirmos o ensinamento cristão ortodoxo a resposta é um sim, mas devemos analisar a bíblia baseado em seu contexto histórico, isto é, analisar pelas lentes daqueles homens que viveram nos dias de Jesus e levando sempre em consideração o que eles criam.

Primeiramente eles não criam ou teriam sido ensinados a acreditarem em uma morada no céu, pelo contrário, a perspectiva que eles nutriam era de aguardarem a instauração do reino de Deus sobre a terra, Mt. 19. 28 “E Jesus disse-lhes: Em verdade vos digo que vós, que me seguistes, quando, na regeneração, o Filho do homem se assentar no trono da sua glória, também vos assentareis sobre doze tronos, para julgar as doze tribos de Israel”Lc. 22. 29-30 “E eu vos destino o reino, como meu Pai mo destinou, Para que comais e bebais à minha mesa no meu reino, e vos assenteis sobre tronos, julgando as doze tribos de Israel”. 

Ao ouvirem as palavras de Jesus dizendo, na casa de meu pai há muitas moradas naturalmente não pensaram que seria fora da terra. Pelo contrário, ao ouvirem estas palavras eles os discípulos, associaram logo que a casa de Deus era aquela que eles sempre ouviram dizer. Ou seja, o templo de Jerusalém, 1ª Rs. 6. 5- 6 “E edificou câmaras junto ao muro da casa, contra as paredes da casa, em redor, tanto do templo como do oráculo; e assim lhe fez câmaras laterais em redor. A câmara de baixo era de cinco côvados de largura, e a do meio de seis côvados de largura, e a terceira de sete côvados de largura; porque pela parte de fora da casa, em redor, fizera encostos, para que as vigas não se apoiassem nas paredes da casa”.

O Templo de Jerusalém é uma estrutura muito grande, mais ou menos retangular, de cerca de quinhentos metros de comprimento por trezentos de largura e está situado no monte Moriá a leste da cidade santa. Naturalmente a compreensão dos discípulos sobre a casa de meu pai anteriormente dita por Jesus levou os seus pensamentos para o templo de Jerusalém, Jr. 7. 4 “Não vos fieis em palavras falsas, dizendo: Templo do Senhor, templo do Senhor, templo do Senhor é este”.

Eis a mentalidade judaica, templo do Senhor, sinônimo de casa do Senhor. Mesmo a ideia de se morar na casa do Senhor é desde o tempo do AT. Sl. 27. 4 “Uma coisa pedi ao Senhor, e a buscarei: que possa morar na casa do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a formosura do Senhor, e inquirir no seu templo”. 

Portanto, não existe uma só descrição na bíblia onde literalmente afirme que a casa do Senhor que é o mesmo que a casa do pai seja a nova Jerusalém descrita em apocalipse; ou seja, Jesus não disse que os salvos terão que subir ao céu para depois descer, são interpretações teológicas que criaram esse corpo doutrinário e haja vista, que essa interpretação sofre mudanças dependendo do ramo denominacional.

A despeito do NT. Ou mais propriamente o livro do apocalipse tratar a questão do templo de Deus de uma forma espiritual ou em outra dimensão, a mentalidade judaica ou a que mais interessava a Jesus naqueles dias que eram os discípulos, e estes interpretavam embasados na sua compreensão teológica e sobre tudo corroborados pelo próprio Cristo, de que a casa do pai era o templo de Jerusalém, Mt. 23. 21 “E, o que jurar pelo templo, jura por ele e por aquele que nele habita”.

Muitos irão dizer: mas a bíblia diz que o trono de Deus está no céu... é verdade, diz, contudo diz também que Deus habitava o templo, caso contrário Jesus não poderia ter dito as palavras acima, associando o templo sendo habitado pela presença de Deus, 2ª Cr. 7. 2 “E os sacerdotes não podiam entrar na casa do Senhor, porque a glória do Senhor tinha enchido a casa do Senhor”.

Esta era a realidade, este era o ensinamento e sobre tudo, este era o pensamento que permeava a mentalidade dos discípulos. A casa do pai logo era associada ao templo, Jo. 2. 14-16 “E achou no templo os que vendiam bois, e ovelhas, e pombos, e os cambiadores assentados. E tendo feito um azorrague de cordéis, lançou todos fora do templo, também os bois e ovelhas; e espalhou o dinheiro dos cambiadores, e derribou as mesas; E disse aos que vendiam pombos: Tirai daqui estes, e não façais da casa de meu Pai casa de venda”.

Nesta ocasião Jesus chamou o templo de Jerusalém de a casa do meu pai, e os discípulos entenderam isso, o verso 17 nos confirma o que eu digo, “E os seus discípulos lembraram-se do que está escrito: O zelo da tua casa me devorou”. Será que em outra ocasião as palavras de Jesus concernente “a casa do meu pai” teve outra dimensão? Deveriam os discípulos esquecerem-se os ensinamentos contidos em toda a bíblia e voltarem-se suas mentes para uma nova realidade a qual eles não compreendiam? 

Jo. 14. 3 “E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também”. Resumindo: “E quando eu for” digamos que a interpretação seja realmente a ida de Jesus para o céu; só não nos é dito que os discípulos e os salvos iriam para o céu com ele, ao invés disso é dito: “virei outra vez”. “E vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também” Naturalmente estas palavras ficam subentendidas, pois de nenhuma forma assegura uma ida ao céu, cabendo aqui as diversas interpretações existentes no meio cristão.

Acredito que de uma forma literal Jesus estava falando do estabelecimento do reino de Deus, tendo os discípulos como seus ministros, por isso a menção a casa do pai, local simbolo da soberania do povo judeu. De uma forma espiritual tenho também uma interpretação bíblia, interpretação esta que não é as moradas no céu, contudo, fica para uma outra ocasião.