quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O sábado é um mandamento moral ou cerimonial?

Dentro do cenário religioso tradicionalmente é ensinado que os nossos deveres morais vieram de ordens divinas, (verdade esta a qual também compartilho). O problema está em afirmar que tais valores são oriundos dos dez mandamentos. Sendo assim, as denominações cristãs enfatizam a necessidade de um dia separado para culto, (pensamento que também compartilho). O argumento da maioria delas é que o domingo tomou o lugar do sábado judaico no novo testamento, portanto os líderes denominacionais enfatizam a guarda do domingo como sendo um cumprimento do dia do Senhor.

Ao passo que as denominações sabatistas ensinam a obrigatoriedade da guarda do sábado, tendo como resultado da sua transgressão a perda da vida eterna. De uma forma ou de outra, tanto sabatistas como dominguistas atribuem a guarda do dia do “Senhor” como sendo um meio de adquirir a salvação.

Portanto, visto que os dez mandamentos são ordens divinas e que trás no seu conteúdo os deveres e os valores morais para reger a humanidade, concluiu-se então que a guarda do sábado para os sabatistas ou do domingo para outras denominações (dominguistas) é um dever moral o qual os crentes estão obrigados a cumprir. Entretanto, na minha concepção não acredito que os nossos deveres morais estejam restritos somente aos dez mandamentos. Ao contrário, acredito ainda que os dez mandamentos não tragam no seu escopo integral valores morais objetivos, veremos o porquê disso.

Podemos dividir os valores morais em três níveis distintos, a saber: convenções sociais, preferências pessoais, Deus. Logo em se tratando de questão religiosa todas as denominações erguem a vos dizendo que o mandamento do descanso semanal trás consigo um dever moral eterno. Não podemos negar o fato de que o descanso semanal tem o seu valor moral inegociável, fato é que ninguém é de ferro, mas acreditar que o dever moral está interligado com a obrigação universal de se observar um dia entre os sete não faz sentido.

A menos que seja uma ordem expressa do próprio Deus, como foi com o povo de Israel logo após o êxodo. Repare na parte em itálico (universal) acredito que muitos ao lêem este assunto dirão que foi Deus quem recomendou separar um dia dentre os sete, logo se é uma recomendação expressa do próprio Deus o dia de descanso (variando somente na interpretação do dia em cada denominação.?) significa que tal dia trás consigo um valor moral objetivo e eterno significando que todos, sem distinção, estão obrigados moralmente a observá-lo.

Mas uma simples leitura dos textos bíblicos nos mostra que a ordem divina de se guardar o sábado foi para Israel Ex. 34.27 (Disse mais o Senhor a Moisés: Escreve estas palavras, porque, segundo o teor destas palavras, fiz aliança contigo e com Israel.) Dt. 4.13-14 (Então, vos anunciou ele a sua aliança, que vos prescreveu, os dez mandamentos, e os escreveu em duas tábuas de pedra. Também o Senhor me ordenou, ao mesmo tempo, que vos ensinasse estatutos e juízos, para que os cumprísseis na terra a qual passais a possuir.) 2ª Cr. 5.10 (Nada havia na arca senão as duas tábuas que Moisés ali pusera junto a Horebe, quando o Senhor fez aliança com os filhos de Israel, ao saírem do Egito.)

Argumentar como fazem os líderes religiosos que tais ordens estenderam-se para o Israel espiritual é forçar o texto bíblico, claramente a bíblia nos diz que a primeira aliança foi feita exclusivamente com Israel Sl. 147. 19-20 (Mostra a sua palavra a Jacó, as suas leis e os seus preceitos, a Israel. Não fez assim a nenhuma outra nação; todas ignoram os seus preceitos. Aleluia!)
         
A obrigatoriedade da guarda do sábado para os judeus pós êxodo deve ser entendido como um dever moral? Sim, pois partiu de uma ordem expressa do próprio Deus para a nação, não de uma convenção seja ela religiosa ou social baseada em retóricas ou revelações. O fato de ser consenso entre a nação judaica todo o complexo que compreendia o mandamento do sábado para o povo judeu deve ser considerado um valor moral objetivo.

Porém, para nós os gentios (outros povos) que não recebemos uma ordem direta, vinda do próprio Deus, o valor moral está baseado no princípio do descanso. Princípio este que preenche a necessidade física, biológica e também espiritual do homem, lógico daquele que busca a Deus, mas a questão cerimonial se encontra no fato do mandamento ter o seu princípio regulador alicerçado no horário, ou seja, de por do sol a por do sol. 

A obrigação moral de uma pessoa para com o seu semelhante compreende todos os momentos em que vive tal pessoa, não é determinado por períodos. Imagine se o mandamento que diz: não matarás, fosse regido de por do sol a por do sol, podemos acreditar que a situação do mundo em que vivemos estaria pior do que se encontra. O mesmo pode-se dizer do primeiro mandamento, a ordem de não se ter outros deuses vai além de determinados períodos da semana.

Assim sendo, dentro mesmo do decálogo encontramos sim princípios cerimoniais e encontramos princípios morais dentro dos mandamentos ditos e ensinados como cerimoniais. Êx. 22.21-22 (Não afligirás o forasteiro, nem o oprimirás; pois forasteiros fostes na terra do Egito. A nenhuma viúva nem órfão afligireis.) Êx. 23.2 (Não seguirás a multidão para fazeres mal; nem deporás, numa demanda, inclinando-te para a maioria, para torcer o direito.) Lv. 19.16 e 18 (Não andarás como mexeriqueiro entre o teu povo; não atentarás contra a vida do teu próximo. Eu sou o Senhor. Não te vingarás, nem guardarás ira contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor.)

Atentemos para o seguinte, os mandamentos cerimoniais estão sempre acompanhados das seguintes expressões: aliança perpétua, sinal perpétuo, mandamento perpétuo, estatuto ou concerto perpétuo entre Mim e vós, nas vossas gerações. A bíblia não fala  que não matar, ou não roubar ou amar a Deus sejam sinal perpétuo, porque estes são mandamentos morais e não podem servir como sinal entre Deus e os judeus , nem entre Deus e qualquer povo, porque são obrigatórios para todos os povos.

As conotações de mandamentos perpétuos, sinal e estatutos perpétuos, caracterizam apenas os mandamentos cerimoniais, conforme Gn. 17.11 (Circuncidareis a carne do vosso prepúcio; será isso por sinal de aliança entre mim e vós.) Êx. 28.42-43 (Faze-lhes também calções de linho, para cobrirem a pele nua; irão da cintura às coxas. E estarão sobre Arão e sobre seus filhos, quando entrarem na tenda da congregação ou quando se chegarem ao altar para ministrar no santuário, para que não levem iniquidade e morram; isto será estatuto perpétuo para ele e para sua posteridade depois dele.)

Êx. 31.16 (Pelo que os filhos de Israel guardarão o sábado, celebrando-o por aliança perpétua nas suas gerações.) Quanto as denominações que insistem que o domingo é um mandamento moral, erram pelo fato de não haver sequer uma menção escriturística que aponte isso. Mas se querem descansar no sábado ou no domingo que o façam, contudo ensinar que tal mandamento é um dever moral passivo de salvação... isso é mentalidade de grupo que querem se destacar dentro do cenário religioso competitivo.