Os evangelhos não terminam com o sepultamento de
Jesus, mas com a descoberta do sepulcro vazio pelas mulheres. No Novo
Testamento as histórias do sepultamento e do sepulcro vazio são a mesma
história, apesar de terem sido escritas por fontes diferentes. Seria improvável
que os primeiros cristãos fizessem circular uma história que terminasse com o
sepultamento de Jesus, tal história ficaria incompleta se terminasse com o seu
sepultamento, porém os evangelhos demonstram as mulheres vendo e relatando
sobre o sepulcro vazio.
Mc. 16.1-6 (Passado
o sábado, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram aromas para
irem embalsamá-lo. E, muito cedo, no primeiro dia da semana, ao despontar do
sol, foram ao túmulo. Diziam umas às outras: Quem nos removerá a pedra da
entrada do túmulo? E, olhando, viram que a pedra já estava removida; pois era
muito grande. Entrando no túmulo, viram um jovem assentado ao lado direito,
vestido de branco, e ficaram surpreendidas e atemorizadas. Ele, porém, lhes
disse: Não vos atemorizeis; buscais a Jesus, o Nazareno, que foi crucificado;
ele ressuscitou, não está mais aqui; vede o lugar onde o tinham posto.)
Muitos teólogos preferem a fonte de Marcos, isso
pelo fato de sua simplicidade escriturística. Apesar da ressurreição em si não
ser testemunhada (somente o sepulcro já encontrado vazio) a fonte de Marcos a
descreve de uma forma bastante simples acerca do triunfo de Jesus sobre o
pecado e a morte, não há utilização de títulos nem citações de profecias
cumpridas ou mesmo descrições do Senhor ressuscitado. Portanto, isso é muito
diferente de uma ficção criada por cristãos.
Para fazer uma ideia de quão comedida é a
narrativa de marcos, basta ler o relato do evangelho apócrifo de Pedro, que
descreve a triunfante saída de Jesus do sepulcro como uma figura de proporções
gigantescas, cuja cabeça alcança as nuvens, sustentada por anjos gigantescos,
seguida por uma cruz que fala, anunciada por uma voz vinda do céu e
testemunhada pelos guardas romanos, líderes judeus e uma multidão de espectadores.
Isso demonstra o quão real as lendas se parecem: elas são coloridas por
acréscimos teológicos e apologéticos. Já o relato de Marcos, por contraste, é
inflexível em sua simplicidade.
Pouco tempo depois da descoberta do sepulcro
vazio pelas mulheres, Paulo passou a transmitir aquilo que havia recebido de
forma oral, I Co. 15.3 (Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi: que
Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras.) Paulo cita uma tradição
extremamente antiga que se refere à morte e ressurreição de Cristo, Paulo
testifica que recebeu dos contemporâneos de Jesus a informação que ele
realmente tinha morrido.
Mais não ficou só nisso 1ª Co. 15.4-8 (E que foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. E
apareceu a Cefas e, depois, aos doze. Depois, foi visto por mais de quinhentos
irmãos de uma só vez, dos quais a maioria sobrevive até agora; porém alguns já
dormem. Depois, foi visto por Tiago, mais tarde, por todos os apóstolos e,
afinal, depois de todos, foi visto também por mim, como por um nascido fora de
tempo.)
Além disso, duas outras características da
tradição paulina implicam o sepulcro vazio. Primeiro, a expressão “foi
sepultado” seguida da expressão “ressuscitou” implica o sepulcro vazio. A ideia de que um homem pudesse ter sido sepultado e depois ressuscitado, mas seu corpo
ainda ter permanecido no sepulcro é uma noção sem sentido. Para os judeus do
primeiro século não haveria a menor dúvida de que o sepulcro de Jesus estaria
vazio.
Portanto quando a tradição bíblica diz que Jesus
foi “sepultado e ressuscitou” nela está implícito que o sepulcro vazio foi
deixado para trás. Dadas as remotas data e origem dessa tradição, os que a
escreveram jamais poderiam ter acreditado em algo que dissesse que o sepulcro
não estava vazio. A expressão “terceiro dia” testifica do sepulcro vazio.
Embora bastante sintetizada, uma vez que ninguém de fato viu Jesus ressuscitar
dos mortos.
Por que os primeiros discípulos proclamavam que
Jesus tinha ressuscitado no “terceiro dia”? Por que não no sétimo dia? A
resposta mais provável é que foi no terceiro dia que as mulheres encontraram o
sepulcro vazio e, com isso, naturalmente a própria ressurreição veio a ser
datada nesse dia. A descoberta do sepulcro vazio não pode ser relatada como um
desenvolvimento posterior e lendário.
E mais! Existem boas razões para perceber a
presença de fontes independentes para o relato do sepulcro vazio nos outros
evangelhos e em atos.
Mateus claramente trabalha com uma fonte independente, pois
ele inclui o relato dos guardas no sepulcro, Mt. 27.62-63 (E, no dia seguinte, que é o
dia depois da Preparação, reuniram-se os príncipes dos sacerdotes e os fariseus
em casa de Pilatos, dizendo: Senhor,lembramo-nos
de que aquele enganador, vivendo ainda, disse: Depois de três dias,
ressuscitarei.
Além disso, seu comentário sobre como o rumor de
que os discípulos haviam roubado o corpo de Jesus era uma história inventada
que circulava naqueles dias. Mt. 28.15 (E
eles, recebendo o dinheiro, fizeram como estavam instruídos. E foi divulgado
esse dito entre os judeus, até ao dia
de hoje.) Esse relato em Mateus demonstra que ele está respondendo a uma
tradição anterior. Lucas também possui uma fonte independente, pois ele conta a
história, que não se encontra em Marcos, os dois discípulos que foram ao
sepulcro para verificar o que as mulheres contaram sobre o sepulcro estar
vazio.
Lc. 24. 13-15 (Naquele mesmo dia, dois
deles estavam de caminho para uma aldeia chamada Emaús, distante de Jerusalém
sessenta estádios. E iam conversando a respeito de todas as coisas sucedidas.
Aconteceu que, enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou e
ia com eles.) A história não pode ser considerada uma criação de Lucas, pois o
mesmo incidente e relatado de forma independente em João.
Jo. 20.1-2 (No primeiro dia da semana,
Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu que a
pedra estava revolvida. Então, correu e foi ter com Simão Pedro e com o outro
discípulo, a quem Jesus amava, e disse-lhes: Tiraram do sepulcro o Senhor, e não sabemos
onde o puseram.) E também no livro de atos temos mais referencias indiretas
ao sepulcro vazio. At. 2. 32 (A este Jesus Deus ressuscitou, do que todos nós somos
testemunhas.)
Os historiadores pensam ter feito uma descoberta
histórica útil, quando possuem dois relatos independentes do mesmo
acontecimento. Mas no caso do sepulcro vazio temos não menos do que seis
relatos independentes, sendo que alguns deles estão entre os materiais mais
antigos que se encontram no Novo Testamento.
O fato das mulheres terem encontrado o sepulcro
vazio só vem confirmar a sua veracidade. A fim de entender esse ponto
precisamos entender duas coisas acerca do lugar da mulher na sociedade judaica.
Primeiro, as mulheres não eram consideradas testemunhas dignas de crédito. Essa
atitude em relação ao testemunho de mulheres fica evidente na descrição
fornecida por Josefo, historiador judeu, ”das regras para testemunho
admissíveis”.
Diz ele em Antiguidades IV.8 .15 “Que um testemunho de uma
mulher não seja admitido em função de sua leviandade e atrevimento. Na bíblia
não se encontra um regulamento como esse. Antes, é um reflexo da sociedade
patriarcal do judaísmo do primeiro século. Segundo, as mulheres ocupavam um
baixo nível na hierarquia social judaica . comparadas aos homens elas eram
consideradas como cidadãos de segunda classe.
Considere esses textos rabínicos: “Que as
palavras da lei sejam antes queimadas do que entregue as mulheres” (Sotah 19ª)
E também “Feliz aquele cujos filhos são homens, mas infelizes aqueles cujos
filhos são mulheres” (Kiddushin 82b). A oração diária de todo homem judeu
incluía a seguinte benção: “Bendito és tu, Senhor nosso Deus soberano do
universo, que não me criou gentio, escravo ou mulher” (Berachos 60b).
Assim considerando o seu baixo status social e a
incapacidade de servir como testemunhas legalmente reconhecidas, é um tanto
surpreendente que tenham sido mulheres que encontraram, como principais
testemunhas, o sepulcro vazio. Se o relato do sepulcro vazio não fosse
verídico, ou seja, se fosse uma lenda, nessa lenda provavelmente seriam os discípulos
que seriam postos como aqueles que encontraram o sepulcro vazio.
Extraído do excelente livro, Em Guarda.
Postado por Evandro.